Guarulhos/SP - A falta de motoristas de caminhão no Brasil não é novidade. Atualmente, há cerca de 130 mil vagas abertas para caminhoneiros, segundo dados da Fundação Adolpho Bósio de Educação no Transporte – a Fabet. E a estatística é ainda mais preocupante porque 60% do transporte de cargas em território nacional é feito por meio de caminhões. Mas o cenário não é só de apreensão – existem também algumas soluções. Uma delas é tocada pela Scania. A marca sueca de caminhões realiza há quase dez anos uma competição batizada de Melhor Motorista de Caminhão do Brasil – o MMCB. Porém, o objetivo vai além de achar um ganhador e premiá-lo. A meta principal do evento é valorizar e capacitar os profissionais para uma condução mais segura e eficiente. Os valores a serem transmitidos são parecidos com o que a Scania já faz no Top Team, uma competição que abrange os mecânicos das concessionárias da marca sueca. E, claro, sempre com aquela “pitada” de marketing.
Assim como o Top Team, o MMC também é um competição global. Começou na “casa” da Scania, na Suécia. Mas rapidamente se espalhou e, hoje, acontece em 40 países a cada dois anos. E o Brasil é um caso à parte. O evento é superlativo e a edição 2014 já tinha se tornado um sucesso antes mesmo de começar. Ao redor do planeta, o concurso recebeu 85 mil inscritos. Desse montante, 65 mil foram só no Brasil – a última edição em 2012 registrou 47 mil. No primeiro ano, em 2005, houve a participação de 11 mil motoristas.
Todos os inscritos – entre empregados, agregados e também autônomos –, ganharam um curso online gratuito do Serviço Social do Transporte – Sest – e do Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte – Senat –, entidades civis sem fins lucrativos criadas com o objetivo de valorizar os trabalhadores do setor de transporte. O curso também era a primeira etapa da competição. Um prova teórica aprovou 42.536 motoristas para a segunda fase da competição, que foi afunilada em seletivas regionais. A Scania percorreu o Brasil. Foram 14 cidades, 1.184 profissionais participantes, horas de cursos, palestras e provas práticas. Dessa maratona, apenas dois campeões de cada região – 28 ao todo – foram selecionados para a grande final do MMCB 2014, que aconteceu entre os dias 5 e 6 de dezembro em São Paulo.
Com base na competição, a Fabet obteve dados importantes de quem chega até as etapas regionais. São motoristas que conseguem reduzir em até 47% os acidentes e obtém até 15% de economia de combustível – um dos grandes “vilões” dos custos operacionais. Além disso, o profissional mais treinado reduz em 10% o tempo de viagem, gasta 10% menos de pneus, diminui em 40% as trocas de marchas e em 50% o número de frenagens. “Temos certeza de que estamos contribuindo para um transporte mais seguro e eficiente, trazendo resultados operacionais para todos na cadeia de transporte e valorizando o motorista como ator importante nesse processo”, afirmou Mathias Carlbaum, diretor-geral da Scania no Brasil. Rodrigo Machado, coordenador do MMCB, vai além. “Conhecemos muitos motoristas que, após passarem por uma etapa regional, conquistaram vagas em transportadoras ou foram promovidos a instrutores dentro de suas frotas. No caso dos autônomos, mudaram a sua maneira de conduzir, de atender seus clientes”, avaliou.
A final também não foi fácil para os competidores. Apesar do clima amistoso, os motoristas passaram por mais testes. Os temas eram primeiros socorros, verificação de todos os itens necessários do caminhão para uma viagem segura, prova de percurso e mais uma avaliação teórica, além de um teste prático de habilidade. Os 18 mais bem colocados passaram para as quartas-de-final da disputa, onde sobraram apenas três finalistas.
Os dados do MMCB registram 38 mil horas de treinamento de motoristas em sala de aula e mais de 174 mil profissionais que passaram pelas cinco edições. E mesmo após oito longos meses rodando com a “caravana” do Melhor Motorista de Caminhão do Brasil, Rodrigo Machado já planeja a sexta edição, que vai ocorrer em 2016. “Se eu disser que eu não estou aqui pensando na próxima edição eu estaria mentindo. Já anotei algumas coisas durante o dia e a gente vai desenvolver. A grande vantagem do MMCB é que é um projeto vivo. A gente trabalha com pessoas, com as necessidades delas. O caminhão evolui a cada temporada. As leis mudam. E o projeto vai se adaptar de acordo com o setor”, finaliza.
Reis da boleia
O MMCB 2014 ainda reservou uma bela história. Eliardo Locatelli, de 33 anos e natural de Carazinho, no Rio Grande do Sul, pela terceira edição seguida, venceu a etapa regional e participou da grande final. “Bateu na trave” em 2012. Mas nessa edição não deixou escapar o título e superou os outros dois competidores em mais uma prova que avaliava a perícia em manobras. “Aprendi muito nos últimos quatro anos participando do MMCB e recebendo o treinamento por meio dos cursos oferecidos gratuitamente. Usei todo esse conhecimento na prova final”, disse o campeão. Locatelli aproveitou a oportunidade para dar um recado. “Os motoristas de caminhão ainda são considerados um patamar abaixo na sociedade. Mesmo com toda responsabilidade que carregamos não somos valorizados. Depois de hoje, vai ter muito patrão revendo suas opiniões”, desabafou. Além do bonito troféu, o campeão levou para casa R$ 40 mil em prêmios e uma viagem à sede da Scania, na Suécia. Locatelli ainda ganhou mais 40 horas de curso no Sest Senat para continuar se aprimorando.
O vice-campeão Marcos Araldi, outro gaúcho, de São Leopoldo, tem 35 anos ainda teve uma adversidade extra durante o MMCB. Antes da final, o motorista perdeu o emprego. Porém, acredita que, com o conhecimento e treinamento adquirido na competição, essa situação será logo revertida. “Pretendo buscar uma recolocação no mercado, mas agora posso dizer que o cenário vai ficar mais fácil. Além do título de vice-campeão, terei a oportunidade de receber mais conhecimento com os diversos cursos que ganhei”, projetou. A terceira colocação ficou com o mineiro Anderson Darer. Além do curso de 40 horas do Sest Senat, ambos ganharam também uma viagem para um resort no Brasil. Depois da longa jornada de competições árduas, um descanso cai bem.
Autor: Raphael Panaro (Auto Press)
Fotos: Divulgação