A preocupação com a sustentabilidade é cada vez mais constante no Brasil. Metas de redução de emissão de poluentes viraram foco de diversos relatórios internos de indústrias, inclusive muitas que atuam no ramo automotivo. Foi de olho nesse nicho que a Scania apresentou, há pouco mais de quatro anos, seu semipesado P270, caminhão movido a etanol. Mas só no final do ano passado conseguiu realizar, de fato, sua primeira venda do modelo: três unidades adquiridas pela Clariant, fabricante de especialidades químicas que agora é a primeira empresa da América Latina a contar com cavalo mecânico a etanol da Scania. “Com esses caminhões, trabalharemos diretamente na redução de emissões de gases de efeito estufa, para o qual temos objetivos claramente definidos” explica Manfred Schwarz, diretor de Operações da unidade de negócios Industrial & Consumer Specialties da Clariant para a América Latina.
O P270 tem motor de cinco cilindros 8.9 litros e, como seu nome sugere, rende 270 cv de potência. O torque é de 122,4 kgfm, disponível já a partir de 1.100 rpm. Com essas especificações, a Scania garante que ele mantém as características de potência, mobilidade e rendimento do trem de força similares às de um modelo do mesmo porte, movido a diesel. Até porque funciona em ciclo diesel, ou seja, com combustão por compressão sem faísca. Isso é possível porque tanto o etanol quanto o diesel trabalham bem com taxas de compressão mais altas. “Suas características são muito mais apropriadas para sua utilização no transporte de cargas. Além da longevidade maior, o rendimento energético é melhor do que se utilizássemos ciclo Otto”, compara Emílio Fontanello, engenheiro de Pré-Vendas da Scania no Brasil. No ciclo Otto, normalmente adotado nos motores a gasolina e flex, uma centelha produzida pela vela de ignição desencadeia a explosão interna.
Mas priorizar a sustentabilidade, nesse caso, exige um “desapego” maior aos custos operacionais. Isso porque o caminhão movido a etanol já é, naturalmente, cerca de 10% mais caro que um semelhante que se alimente de diesel. Além disso, a manutenção também é mais dispendiosa. “São intervenções um pouco mais frequentes, com custo levemente superior também. É difícil precisar quanto será essa diferença porque estamos trabalhando para otimizar esse serviço e deixá-lo o mais barato possível. Mas é totalmente viável”, assegura Emílio, da Scania. Segundo ele, a tendência é que, quanto mais empresas aderirem à novidade, mais o preço de venda do produto e as despesas com manutenção barateiem. “O aumento da demanda vai fazer a diferença diminuir”, garante.
Segundo a Scania, a redução na emissão de poluentes pode ultrapassar os 90% nos motores a etanol, se comparados a caminhões diesel do mesmo porte. Esse número, na verdade, depende das condições de uso. No caso dos três caminhões adquiridos pela Clariant, por exemplo, eles atuam em configuração 4X2 na fábrica da marca em Suzano, no interior de São Paulo. Batizados pela empresa como Ecotrucks, eles realizam o carregamento de até 25 mil litros de produtos químicos, levando-os até a frota rodoviária de caminhões que partem para as entregas aos clientes.
Apesar de atuarem apenas internamente, os modelos a etanol produzidos pela Scania trabalham 24 horas por dia, divididos em quatro turnos nos sete dias da semana. Nesse processo, cada um deverá fazer pouco mais de 11 mil movimentações por ano, ou seja, quase 35 mil ao todo levando em conta os três veículos. “Optamos por utilizar a frota Scania a etanol em substituição aos caminhões a diesel que faziam essa função. Tendo em vista a quantidade de movimentações e as distâncias percorridas diariamente, nossa expectativa é uma redução anual considerável de emissões. Temos certeza de que essa operação pioneira com combustível renovável será um sucesso”, avalia Schwarzm, da Clariant.
Mas a Clariant tem uma vantagem que foi fundamental na adesão aos caminhões a etanol utilizados pela Scania. O combustível ED95 utilizado pelos veículos têm em sua composição 95% de etanol e 5% do aditivo Master Batch ED 95, produzido pela própria Clariant no Brasil. A produção local otimiza custos e logística. O aditivo permite que motores desenhados para consumir diesel utilizem etanol hidratado, ajustando as características do combustível às necessidades do motor para obter um bom funcionamento do veículo. Mas a mistura precisa ser realizada fora do tanque de combustível. “Acreditamos que essa venda se reflita em novas oportunidades para o mercado brasileiro. A Scania prima pela sustentabilidade. Por isso, tem foco em melhor eficiência energética com economia de combustível e redução de CO2. O caminhão a etanol é uma solução para empresas comprometidas em diminuir os impactos ambientais de suas operações de transporte”, defende Mathias Carlbaum, diretor-geral da Scania no Brasil.
O motor utilizado no caminhão P270 já circula na cidade de São Paulo, mas em frotas de ônibus. Na verdade, a Scania anunciou em 2007 o início dos testes com ônibus movidos com o combustível no Brasil. Após um período de demonstrações em São Paulo, foram anunciadas as primeiras vendas de ônibus a etanol da história do Brasil, para a Viação Metropolitana, atual MobiBrasil, que comprou 50 unidades. Além dela, a Tupi Transportes também adquiriu 10 unidades. Ambas utilizam os veículos em operação pública urbana.
Desde abril de 2013, a Natura utiliza um ônibus também movido a etanol, de modelo K 270 4x2, para transporte de seus funcionários. A empresa foi a primeira no Brasil a adquirir um ônibus de fretamento movido ao combustível alternativo. O veículo conduz colaboradores para Cajamar, cidade na região metropolitana de São Paulo, onde está instalada a sede da empresa. O chassi Scania adquirido possui um tanque de combustível de maior autonomia, com capacidade para 500 litros – o tradicional leva apenas 300 litros.
Autor: Márcio Maio (Auto Press)
Fotos: Divulgação